quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

pena

com uns cinco quilos no olhar, ele me encarou duro por alguns segundos. eu preferia que falasse, que gritasse, que xingasse, que avançasse em cima de mim em descontrole. mas ele limitou-se a puxar um pouco de ar, entreabrindo a boca como quem vai começar a dizer algo, e em seguida desistir num suspiro. encolheu um pouco os ombros, desviando o olhar para o chão, e saiu, me deixando deserta e culpada sem castigo. eu merecia sua raiva, raiva que ele reprimiu e não me deu. ele não me deu o que eu merecia! me senti um pouco insultada. que gritasse! que xingasse! mas me deixou ali, sem dizer palavra, segurando um certo impulso de correr atrás dele pra reivindicar o que era meu: vá!, me chame dos nomes que você tá pensando, me mande pros lugares que você tá pensando. mas ele me deixou sem castigo e isso me atormentou a noite inteira. chorei sem fim, ele havia ido embora em silêncio e eu sabia que barulho era raiva, mas silêncio era mágoa. eu o havia magoado e não me sentia capaz de perdoar a mim mesma por isso. passaria a vida inteira devotada a ele, perdoando-o sempre, aguentando suas ausências, seus caprichos, seu humor. não saberia dizer um não a ele, assim como não saberia dizer adeus. era a minha pena.

4 comentários:

Abelardo gonzález disse...

Uma pena de certa forma não tão penosa.

IN-merecível.

com certeza.

JFGama disse...

Gozei com o fluxo e com a intensidade.

Paula Brasileiro disse...

Como dizem né "Pior do que uma voz que cala é o silêncio que fala!". Menina, é uma tarde de presentes! Obrigada pela sua visita, adorei! E adorei tb conhecer teus blogs, são lindos! Voltarei mais vezes! Beijão!

Nocturna disse...

"mas ele me deixou sem castigo e isso me atormentou a noite inteira."

incrível, essa sua força nas palavras.